O termo “Quiet Quitting” ecoa como um fantasma nos corredores das empresas. Virou um rótulo conveniente para explicar a queda de produtividade, a apatia e o distanciamento que tantos líderes observam em suas equipes. A reação instintiva de muitos é culpar a nova geração, a falta de comprometimento ou a preguiça. Mas e se tudo isso for apenas um diagnóstico errado?
Da minha perspectiva, após décadas atuando como psicanalista e no desenvolvimento de lideranças, afirmo com segurança: o Quiet Quitting raramente é um problema do colaborador. Ele é um sintoma visível de um sistema onde a liderança está relacionalmente ausente. É o grito de socorro silencioso em resposta a um ambiente que falhou em prover o essencial.
O Diagnóstico Errado que Aumenta o Problema
Quando um líder encara o “desligamento silencioso” como uma falha de desempenho individual, sua reação padrão é aplicar mais controle. Mais dashboards de acompanhamento, mais reuniões de status, mais pressão por resultados. O efeito? O exato oposto do desejado. Essa abordagem apenas reforça no colaborador a sensação de que ele não é confiável, compreendido ou valorizado como ser humano, intensificando seu mecanismo de defesa, que é o distanciamento.
Essa é uma falha em enxergar a dinâmica por trás da dinâmica. Trata-se de medicar o sintoma enquanto se ignora a doença.
A Raiz do Problema: A Quebra do Contrato Relacional
Em todo ambiente de trabalho, existe um “contrato relacional” implícito, um conceito que exploro em profundidade no livro “Gente Inteligente Sabe se Relacionar”. Este contrato vai muito além do salário no fim do mês. Ele envolve expectativas não escritas de reconhecimento, oportunidade de crescimento, propósito no que se faz e, acima de tudo, segurança psicológica.
O Quiet Quitting é a consequência direta da quebra deste contrato. Acontece quando o profissional, dia após dia, sente que sua entrega não é vista, sua voz não é ouvida e seu bem-estar não importa. Da perspectiva psicanalítica, o “desligamento” é um ato de autopreservação. É o ego se protegendo de um ambiente que gera frustração, ansiedade ou dor, investindo o mínimo de energia necessária para sobreviver. Não é preguiça, é estratégia de sobrevivência emocional.
O Líder como “Espelho” e a Cura pela Conexão
A solução não está em novas ferramentas de gestão, mas em um novo tipo de liderança. Como detalho em “Gente Inteligente se Olha no Espelho”, a transformação começa quando o líder tem a coragem de olhar para si e perguntar: “Como meu comportamento está contribuindo para este cenário?”.
A cura para o Quiet Quitting passa por reestabelecer o contrato relacional. E isso é feito através de três práticas fundamentais da Inteligência Relacional:
- Praticar a Escuta Ontológica: Ir além das palavras ditas em uma reunião de feedback. É escutar as emoções, as preocupações e as ambições que não estão no relatório. É criar um espaço onde o colaborador se sinta seguro para ser vulnerável e honesto sobre seus desafios.
- Mudar o Foco do Feedback: Parar de usar o feedback como um “julgamento” sobre o passado e transformá-lo em um diálogo sobre o futuro. A pergunta-chave muda de “Por que você fez isso?” para “O que precisamos, juntos, para alcançarmos nosso objetivo da próxima vez?”. Isso posiciona o líder como um aliado, não um adversário.
- Criar Rituais de Reconhecimento Genuíno: O reconhecimento não é um bônus anual. É o “bom dia” atencioso, o elogio específico a um trabalho bem feito em uma reunião de equipe, a celebração de pequenas vitórias. São esses pequenos atos que reconstroem a confiança e o sentimento de valorização.
Em suma, a epidemia de Quiet Quitting é um chamado urgente para um novo paradigma de liderança. Um que entende que, em um mundo cada vez mais tecnológico e impessoal, a conexão humana não é apenas um “diferencial”, mas a única fundação sobre a qual se constrói uma equipe verdadeiramente engajada, inovadora e resiliente.
Essa reflexão fez sentido para a sua realidade? Compartilhe nos comentários qual o maior desafio relacional que você enfrenta com sua equipe. Para aprofundar nestes conceitos, convido você a conhecer meus livros e meu trabalho.